Bolas e Letras
Era para ser sobre futebol e livros. Mas há tanto mundo mais, a mente humana dispersa-se perdidamente, o país tem tanto sobre que perorar, eu perco-me de amores bem para lá da bola e das letras: Evas, vinho, amor, amigos, cinema, viagens, eu sei lá!
O Mundo pode ser um lugar maravilhoso - menos siso
Fotografia tirada por Peter Sellers à sua mulher, Britt Eckland, Roma, 1965
Levamo-nos demasiado a sério, cometemos cada vez menos loucuras. É sabido que os cemitérios são depósitos de circunspeção, pouco dados a arrebatamentos de muito riso e pouco siso, mas queremos mesmo ser recordados como seres sérios e de tromba fechada? Quando contarem histórias do que fomos e fizemos o nosso sonho é que brindem em nossa memória com epítetos de “epá, foi o gajo mais sério e empedernindo que já passou por este mundo”? Tenhamos menos juízo, malta, a puta da vida são dois dias.
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A felicidade à mão de semear - amizade
Demasiada gente desirmanada. Demasiadas almas penadas desavindas do amor e das comunhões físicas e espirituais que supostamente fazem o mundo mover-se, a segurança social pagar-se e as vidas valerem a pena. Ainda que nem sempre, há fogachos de felicidade que justificam o porquê de aqui andarmos, nem sempre só com a cabeça entre as orelhas. Demasiada gente que idolatra os seus dóceis e fiéis animais de estimação, demasiadas existências que padecem de um medo doentio de arriscar o amor humano, de expor-se à descoberta que a fidelidade habita apenas o mundo animal. As amizades são hoje o novo mundo das relações, um antídoto anti-solidão sem os perigos das paixões assolapadas. Muito bem, o ser humano adapta-se desde tempos imemoriais, porque não? Ainda assim, para que os rasgos de luz atravessem por vezes a estrada da vida não posso deixar de sugerir uma reflexão sobre a imagem que ilustra este texto. Porque não? Friends with benefits, como certamente terá gracejado algum fleumático ator inglês.
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O mundo pode ser um lugar maravilhoso - Esplanada
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Divas - Marilyn Monroe
Nova Iorque, 1956. O fotógrafo Cecil Beaton é "capturado" no exercício da sua arte pelo colega Ed Pfizenmaier. Marilyn, magnífica na sua naturalidade, sentenciou para a nossa eternidade: "If you can make a girl laugh, you can make her do anything".
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O mundo é um lugar pouco recomendável - episódio 2
Fotografias por Paula Bronstein
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Divas - Laetitia Casta
Laetitia Casta, fotografada para a Paris Match, setembro de 2004. Dificilmente poderemos imaginar uma mulher que goste mais de ser mulher do que ela parece disfrutar. Escutemo-la, sobre esse prazer inigualável: "I enjoy being a woman. It's what I learned from years of experience in modeling. You learn how to seduce; how to be sensual, how to play. It's very important for a woman, I think. But it's not by beauty that you seduce. It's a meeting - it depends on the image the other reflects back to you, how they see you and make you feel."
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O mundo é um lugar pouco recomendável - episódio 1
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A tradição já não é o que era
Famílias tradicionais, prazeres inconfessáveis, demónios ocultos sob a tranquilidade de uma equilibrada gestão da economia doméstica. Recordo sempre com saudade aquele professor do secundário mais severo e disciplinador, o que indubitavelmente seria encontrado por algum aluno a transgredir, ou com o cigarro errado no canto da boca, no recanto mais improvável dos infinitos botecos alfacinhas, ou com a mão no sítio certo da esposa errada. Ah os defensores dos valores tradicionais, os arautos do respeitinho é muito bonito, os idólatras do sexo como veículo único e omnipotente da (pro)criação eticamente assistida. Lençóis imaculados e passadinhos a ferro como recomenda a sogra, alvos como a impoluta esposa, a divina santa que recebe submissa e agradecida a semente do missionário, na respetiva e invariável posição religiosamente aconselhada. A inominável e abençoada pureza que, natural e diabolicamente não satisfaz o lobo com vestes de cordeiro, o selvagem escondido por trás do aprumo e dos amados sacramentos, o homem insatisfeito que dedicará a vida a procurar quem lhe sacie o desejo animal, mas que não abdicará de passar metade dos seus dias a chicotear na praça pública os devassos e as prostitutas sem valores, tudo enquanto esconde a restante metade da existência por trás dos seus pecados e transgressões. E as esposas, essas incompreendidas santas, as esposas que se amam como mães e que amargamente choram o desconhecimento da verdadeira paixão, as que sonham sentir algo mais do que o jorro mecânico e precoce que as ensinaram a receber, as penitentes alunas, as que bebem a doutrina que lhes impregnaram sob a pele de que era só o que havia a receber.
Benditas as que provaram o fruto proibido, benditas as que escolheram homens que querem que elas sejam efetivamente mulheres, seres pensantes e livres, corpos excitados e fontes de amor e orgasmos, existências únicas e autónomas. Um homem que realmente ame as mulheres sabe, em toda a sua plenitude, que uma mulher assim, uma mulher verdadeiramente mulher, será sempre em diversas áreas da condição humana um ser a cuja sombra terá de se sujeitar. Um homem que não tenha receio da natural superioridade feminina, que estimule e potencie esse vulcão de energia e amor, é o verdadeiro amante da mais bela flor do universo.
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Marilu, Justino e a fonte dos males da condição humana
Fotografia de André Steiner
Por entre dois dedos de conversa, sem grande expectativa no que por aí viria, há uns dias um amigo decidiu de forma leve, como quem descasca e engole dois tremoços amaciados por um golo de imperial, brindar-me com uma simples e cortante reflexão sobre a origem dos males da condição humana. Dizia ele, enquanto analisava distraidamente a espuma da cerveja a esfumar-se das paredes do fino vidro, que a insatisfação é a principal característica que nos distingue dos animais. Somos o único bicho que nunca se contenta. Que não aproveita realmente, mesmo que por momentos pareça que o está a fazer. Somos o único ser vivo que nunca está presente. Estamos sempre a pensar no amanhã que virá, que esse amanhã será melhor. Os animais não têm futuro, é-lhes conceptualmente vedado. Por isso, vivem no presente, vivem-no mesmo, porque nada mais há para eles. A insatisfação é a essência do ser humano.
Bebo-lhe as palavras enquanto a imperial amolece no copo. Penso nas horas que perco a observar as minhas duas tartarugas - de seu nome Marilu e Justino - na maravilha que é o funcionamento do seu cérebro reptilóide, invejo-lhes profundamente a forma como repetidamente disfrutam dos seus dias. Comer, dormir, apanhar sol, correr e nadar uma atrás da outra com a felicidade de como se o fizessem sempre pela primeira vez. A Marilu, mais pequenina, morre de amores pelo Justino, também chamado de Justinão devido ao seu imponente porte. O zénite do dia dela é quando, finalmente e após inúmeras tentativas, consegue equilibrar-se no topo da carapaça do seu parceiro e tirar uma sorna de algumas horas, aproveitando o cansaço e a eterna paciência do pobre coitado. Inerte para não a incomodar, o olhar do Justino perscruta o nada, recebe o sol como se fosse tudo o que pretende para toda a vida. O sol, apenas o sol, e o aconchego de Marilu nas suas costas.
Ao fim de 5 minutos já perdemos a capacidade de ouvir o que o parceiro está a dizer. Ao fim de 10 segundos pós-orgasmo já estamos a pensar no que fazer a seguir, como se não tivéssemos acabado de ser abençoados pelo êxtase da criação. Como se disfrutar realmente de um momento por alguns minutos fosse a morte de alguma parte de nós. Como se o amanhã fosse o ansiado e inalcançável presente que eternamente buscamos e em que jamais nos instalamos.
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See Naples and die
Nápoles. Máfia, Maradona, crime, um estranho fascínio pelo lado negro da natureza humana. Sei que não morrerei sem visitar aquelas ruas míticas onde se adorou sem limite o maior dos maiores, Diego Armando Maradona. Mas Nápoles será muito mais do que essa louca paixão, vejo-o nos olhos dos personagens reais, de carne e osso, com cheiro intenso a gente que ilustra este post. O fotógrafo Sam Gregg alimenta-me o fascínio com esta coletânea de fotos intitulada “See Naples and Die” (https://www.lensculture.com/articles/sam-gregg-see-naples-and-die). O feio pode ser contraditoriamente belo, o medo uma irresistível fonte de atração, a violência mais não ser do que uma desajeitada e fogosa forma de amar. Um dia perder-me-ei nas tuas ruas, é só o que sei.