Bolas e Letras
Era para ser sobre futebol e livros. Mas há tanto mundo mais, a mente humana dispersa-se perdidamente, o país tem tanto sobre que perorar, eu perco-me de amores bem para lá da bola e das letras: Evas, vinho, amor, amigos, cinema, viagens, eu sei lá!
7 anos do pequeno Miguel
Há alguns anos que assinalo aqui o aniversário dos meus dois petizes com textos mais ou menos lamechas, em jeito de retrospetiva sobre o que é isto de ter filhos e, sobretudo, de ser pai. Mais do que um texto para memória futura (imagino-os a ler isto com 20 anos e a rirem-se na minha cara, mas a vida é assim) acho que o faço, se calhar inconscientemente – até agora, momento em que poderei ter ganho um bocadinho de consciência sobre a razão do assinalar destes dias – como forma de refletir sobre esta gloriosa e nobre missão que é ser pai, educar e, sobretudo, não estilhaçar os sonhos futuros de jovens crianças. O que posso dizer sobre o meu pequeno Miguel que hoje faz 7 anos? Que foi com ele que aprendi um novo conceito de amor, aquele que nasce de uma sensação de ligação carnal (o coração é feito de carne) a um pequeno ser sem vontade própria, sem defesa, envolto naquela aura de fragilidade que é o cúmulo da inocência. Ao longo destes 7 anos acho que o maior esforço foi tentar perceber o ser que se foi desenvolvendo, a sua personalidade em construção, o peso certo entre o ralhete e o mimo, sem estragar nem para um lado nem para o outro. Ah, e fundamental, fazer isto abdicando de muitos dos hábitos de vida que tinha sem abdicar da minha felicidade e realização própria, mas integrando nesse novo ciclo novas formas de felicidade e de realização. O Miguel cresceu, venceu boa parte da sua timidez natural, surpreendeu muita gente em certos pontos da sua evolução (quase sempre no sentido positivo do que significa crescer) e não desiste de dar sempre um passo mais à frente, mais acima. Pai babado, eu? Acho que sou mais um pai feliz porque quase sempre o vejo feliz, creio que não preciso de muito mais do que isso. Parabéns Miquinhas, obrigado por tudo, obrigado por 7 anos de amor incondicional.
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Um dia temos que começar a agir seriamente sobre isto
“A Europa cismou tão obcecadamente na economia que deixou deslaçar a política, negando-se à interpretação óbvia de que o crescimento dos partidos extremos e populistas era a metastatização da própria insubordinação popular.”
Pedro Santos Guerreiro
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Putas e coiotes
Quadro "The client", por Jean Louis Forain
Fere o olhar este vermelho de baton barato de putas baratas. Tudo ali emana mau gosto e cheiros nauseabundos, fluidos corporais que se adivinham mal lavados e pior escondidos do próximo cliente. Os corpos que se vendem já não se interessam por si próprios, são já algo externo às suas proprietárias ou, talvez seja melhor dizer, arrendatárias. Aprenderam a viver e a sentir esquecendo o que de si apartaram - o seu corpo. Usam-no como o carro, a televisão, a banheira de onde escorraçam a vergonha. O homem que espera é o predador moderno, o dono disto tudo, o coiote que remexe as moedas no bolso e com o seu tilintar sente ter o mundo a seus pés. Não lhe interessa a entrega submissa daquelas mulheres, despreza os gemidos fingidos e os exageros vocais fúteis das presas que consome. Só lhe interessa o poder, senti-lo, beber-lhes a humilhação até à última gota. Não é o falso amor que ele procura, é o terror que instiga que o faz viver. Já nem as putas são o que foram, já nem os putanheiros honram a história dos falsos romances.
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Portugal 1 - Croácia 0
Parabéns à nossa equipa, não tão excitante e aventureira como em anteriores cruzadas, mas mais fria, mais calculista, mais capaz de não se deixar ir na louca paixão de tudo arriscarem em busca da vitória, mais preparada para combater os revezes da fortuna que o futebol esconde. Fernando Santos não é um especialista em ganhar sem espinhas, mas é genial em não perder, o que nos tempos que correm é aquilo de que se calhar mais falta temos. Outro mérito do nosso Engenheiro passa por ter finalmente constituído um grupo decididamente coeso, onde os que jogam e os que estão no banco percebem que ambos são importantes, daí que os que entram rendem e os que se sentam percebem que têm que estar preparados porque amanhã pode ser a vez deles. Passo a passo, quem sabe se não é desta? Força rapazes!
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Estúpida e orgulhosamente sós
A capacidade de nos autoflagelarmos é proporcionalmente inversa à nossa inteligência. Sentimos o cheiro do napalm que se infiltra insidiosamente no alcatrão e deixamo-lo entranhar-se nas nossas roupas, no nosso corpo, nas nossas vidas. Sim, falo dos ingleses, esses orgulhosos e pedantes isolacionistas, esses seres iluminados que se julgam mais que todos os outros e que disseram sim a viver orgulhosamente sós. Serão inúmeros os defeitos desta União Europeia coxa, burocrática, pesada, tantas vezes fria e desumana. Não obstante, a vida e o mundo são feitos desse processo (des)construtivo: identificar o que está mal, desenhar medidas para a mudança, reunir forças e apoios para as implementar e, no final, celebrar a maravilha que é o génio humano e a sua capacidade de caminhar para um mundo melhor. Isto parece ingénuo e utópico mas é mesmo assim, porra. Sobrevivemos à barbárie da idade média, a guerras mundiais, a holocaustos, a pestes negras e bubónicas, à fome e às secas, caímos no buraco negro do medo e do desespero e conseguimos sempre trepar pelas escarpas rochosas até atingirmos a luz, feridos mas realizados. Tudo isso fizemo-lo sempre de mãos dadas, nunca ninguém venceu nada sozinho contra o mundo. Fuck you, Brexit!
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Frisson
Fotografia por Sam Haskins
Abriu o e-mail e sentiu um arrepio na espinha. Não sabia bem como descrever essa sensação, mas sentira mais naquela manhã (sentira-se mais viva, mais mulher) em que, por um qualquer impulso não explicado, decidira começar o dia a abrir o seu correio electrónico pessoal, do que sentira nas últimas tristes e rotineiras semanas de trabalho. A mera percepção de que o remetente da mensagem era ele provocava-lhe um je ne sais quoi, um frisson, um estranho e distante arrepio na espinha - em tradução livre e em bom português. Dele aprendera a receber uma multiplicidade de imagens e sensações. Da vida, do dura que pode ser, mas também dos seus prazeres, dos que já sentira, daqueles que ainda lhe massacravam o corpo e a alma por estarem em falta, e daqueles que ainda sonhava vir um dia a experienciar. Dele recebera também um melhor conhecimento de tantos ângulos da vida. Ângulos duros e bicudos, mas também ângulos torneados pelo desejo e pelas curvas do seu corpo. Sim, sentia que tudo aquilo que em tempos se esfumara parecia agora ainda não ter terminado. Um dia, talvez um dia reunisse em si a coragem e a sabedoria que lhe permitiriam perceber que há passados que serão sempre presente, que há pessoas que por mais que as matemos viverão para sempre em nós. O segredo não passa por conseguir sobreviver a esse ditoso destino, o segredo é saber (con)viver com ele.
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Portugal 3 - Hungria 3
Portugal confunde-se cada vez mais com Cristiano Ronaldo. Confunde-se a parte boa, a de uma assistência perfeita, de dois golos salvadores - um deles de antologia - e um microfone a gritar ao vento que quem não se sente não é filho de boa gente. A parte má da selecção é em boa parte responsabilidade de Fernando Santos, chego hoje a essa conclusão depois de muitos benefícios da dúvida. Moutinho e André Gomes têm, no seu actual estado de forma, bem melhor sentado no banco a vê-los jogar. Os dois laterais foram abaixo do mediano, a defesa vacilou demasiado e, mais do que tudo, esta equipa sofre por não ter fio de jogo, por pressionar mal e de forma desorganizada. CR7 leva a equipa ao colo, com a ajuda de alguns bons jogadores (Nani, Quaresma, João Mário e Pepe hoje), mas isto é pouco, muito pouco para um discurso tão ambicioso, Sr. Engenheiro. Sinto que a equipa pode render mais mas desconfia de si própria, provavelmente da sua estratégia de jogo. A equipa daqui para a frente tem que melhorar, mas para isso o nosso treinador tem que saber o que fazer e quem meter em jogo para permitir essa subida de forma e melhoria de jogo. Veja lá isso, Sr. Engenheiro.
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Sorri grande capitão, sorri muito e faz-nos felizes!
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All you need, love is all you need
Vivemos tempos de hipocrisia e de pudores renovados. A idade média está morta e enterrada, mas os dias da revolução sexual são uma miragem longínqua e bassa. Sim, concedo, nos dias de hoje há abertura para mostrar, falar, fazer trinta por uma linha no que ao sexo respeita. Essa abertura pode até encontrar-se na larga maioria da população. Mas quem domina, quem está à frente de instituições, corporações, quem representa o “bem comum” e a “moral dominante” vive com a preocupação de reprimir os instintos básicos do ser humano, de os negar, vive em busca da melhor forma de os embrulhar em alvos e invioláveis lençóis de linho. Vivemos numa sociedade onde predomina a vergonha perante a natureza animal que é parte integrante e presente do ser humano. Por mais racionalidade que ostentemos não deixamos de ser animais, racionais mas animais. Soubéssemos nós viver a nossa animalidade e viveríamos certamente num mundo bem mais racional. Esquecemo-nos que um animal perseguido, sob ataque constante dos seus predadores é um animal perigoso, neste caso, desnecessariamente perigoso. Quase que apetece dizer que o famoso e universal adágio “make love, not war” significa na realidade “make love and you will kill the need for war”.
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Portugal 0 - Áustria 0
Sim, tínhamos que ter ganho. Sim, se não ganhamos à Áustria, à Islândia ou à Hungria merecemos tanto ganhar o europeu como um cão fofinho merece uma infestação de pulgas. Porque acontece isto se temos o melhor do mundo e mais uma mão cheia de vedetas? Porque somos a equipa com uma ratio de mais oportunidade/menos golos? Porque não há nenhuma selecção que se tenha apresentado neste europeu com um único ponta de lança, sendo que esse único ainda acumula a exclusividade com o facto de ser médio menos. Não há mais? O André Silva é verdinho, sim, e o Hugo Vieira foi o melhor marcador da Sérvia, campeonato mediano, sim, tudo isso é verdade. Mas era mesmo preciso levarmos ao europeu meia dúzia de médios centros semelhantes para 3 posições? Não podíamos ter as vistas um pouco mais largas, mister? Quanto ao Ronaldo, meus amigos, já o digo há muito e o Ricardo Costa explora a ideia hoje no Expresso. Os seus colegas na selecção não são os do Real Madrid ou os do Manchester United dos tempos áureos, pelo que não esperem que ele sozinho faça todos os milagres. Ainda assim, Cristiano, do lado direito do ataque deixa lá ser o Raphael a marcar os livres. Está difícil, está, mas vocês podem dar umas alegrias à malta, mesmo não sendo os 23 melhores do mundo, são os nossos 23! Bora lá, cambada!