Bolas e Letras
Era para ser sobre futebol e livros. Mas há tanto mundo mais, a mente humana dispersa-se perdidamente, o país tem tanto sobre que perorar, eu perco-me de amores bem para lá da bola e das letras: Evas, vinho, amor, amigos, cinema, viagens, eu sei lá!
Acreditar...ou talvez não
Ao contrário da impressão geral, não são as ideias dos outros que nos condicionam o caminho ou nos paralisam os avanços, forçando a recuos ou paragens estratégicas. É a nossa mente, os nossos medos inculcados, as nossas dúvidas ancestrais que nos prendem os movimentos, que nos dizem que o desconhecido é sinónimo de perigo, que tudo o que não consta no nosso cardápio de experiências já vividas pode dar para o torto. Pensamos assim sem pensar que é exactamente o nosso pensamento que nos impede de evoluir. As teias das nossas meninges e sinapses parecem, demasiadas vezes, cristalizadas no tempo assumindo a forma de teias de aranha bafientas e castradoras. Tudo o que pensamos deveria ser objecto de dúvida e de constante interrogação, mas encostamo-nos ao conforto que é obedecermos aos ditames da pessoa de quem mais deveríamos desconfiar, pelo menos enquanto não a questionamos até ao tutano. Vejam lá isso.
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Calma - não dar o corpo pela alma
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Cristiano Ronaldo vs UEFA
Os senhores do poder nunca gostaram de histórias bonitas em que os anões se agigantam, em que quem veio do nada consegue, à custa do seu sangue, suor e lágrimas escalar ao topo da montanha, ombreando com os poderes e hábitos instalados, tapando o sol aos que julgavam que o sol eternamente nasceria só para eles. Cristiano Ronaldo, nascido no seio de uma família pobre (não era humilde, era mesmo pobre), contra todas as adversidades, invejas e vaticínios, tudo venceu, tudo derrubou, sempre sem padrinhos, só com a sua imparável força interior, talento e esforço sobre humano que sempre pôs em tudo o que fez pela sua paixão, pelo seu sonho de ser o melhor jogador do mundo.
Há umas semanas a UEFA atribuiu o prémio de melhor jogador do mundo a Modric, um belíssimo jogador que fez uma excelente época. Cristiano, que fora a estrela da Liga dos Campeões, que com o fruto do seu trabalho a deu de mão beijada ao Real Madrid, foi preterido face a um belíssimo jogador, mas que em nada se pode comparar a ele, sobretudo num ano magnífico para o jogador português. Cristiano, ferido mas amigo, deu os parabéns a Modric mas não pôs os pés na cerimónia da UEFA, pois recusa ser um fantoche nas mãos dos grandes senhores (sempre recusou) e porque não é hipócrita. A UEFA, velha e vingativa, ontem expulsou-o de campo, sonhando que assim conseguirá terminar com o sonho do nosso menino. A UEFA declarou internamente, em surdina, nos meandros cinzentos dos corredores do seu poder bafiento, que Cristiano é persona non grata. A UEFA só não sabe que quem comeu o pão que o diabo amassou, e ainda assim passou fome, e ainda assim não desistiu até chegar ao topo, quem assim é não verga, não desiste, chora mas não vira a cara. É a tua última batalha, Cristiano, e todos os que amam verdadeiramente o futebol, todos os que sabemos quem és e o que nos deste sabemos que a vais vencer, mais uma vez, com sangue, suor e lágrimas, até ao fim, até à derradeira glória. Força miúdo!
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Voltar?
Nunca voltar a um sítio onde se foi feliz ou voltar sempre, insistentemente, convicto de que a receita original poderá eternamente ser repetida? A vida muda-nos mas o que nos mudou poderá ser fonte de renovada evolução? E será que mudar estará sempre mais próximo do que nos torna um pouco mais felizes? E mudar é evoluir? Não haverá um ponto em que irmos para lá do que somos e de onde estamos, essa insatisfação constante, essa interminável busca de melhor mais não é do que sinónimo de inadaptação, de incapacidade para disfrutarmos do que temos e do que somos? Porque perdemos nós tempo a pensar em todos estes irresolúveis dilemas e simplesmente não nos limitamos a ser e a estar, ao sabor da maré, seja ela forte ou calma como um mar morto e terno?
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Do corpo e do espírito
Um bom amigo, mais dado aos prazeres dos sentidos do que aos do espírito, pediu-me um dia, a meio de uma batalha de imperiais, para que na sua lápide ficasse escrito o seguinte epitáfio: “Foram mais as que quis dar do que as que dei”. Quando me ri do seu pedido, ele irou-se e fez-me prometer, sobre a espuma derramada de uma mesa cheia de imperiais, que cumpriria o seu último desejo. Ainda hoje não sei o porquê dessa estranha vontade. Talvez rir-se na cara do mundo, talvez uma amargura animalesca que lhe feria a alma e que necessitava de expurgar, talvez um aviso para o mundo, para a felicidade futura dos seus entes queridos que o visitariam no aniversário da sua morte.
Eu, que não desprezando os deleites do corpo me apego bastante aos prazeres do espírito, deixaria inscrito na minha lápide: “Foram mais os que quis ler do que os que li”. Com pena minha, será essa uma das tristezas que legarei a esta vida. Leiam isto e pensem nisso. E leiam.
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Femme fatale
Foi no momento em que ela lhe virou as costas, naqueles breves segundos em que pairou a ameaça sentida como a mais aguçada faca no peito, foi nesse preciso instante em que todo o seu poder - que ela tão bem conhecia e exercia – se abateu sobre ele, soterrando-o nos seus medos e ridículas inseguranças, foi só nessa fracção de dor e de fátua esperança que tomou consciência de que nunca a perderia. Simplesmente, ela nunca foi dele. Uma mulher fatal não é de ninguém, o que nos é permitido mais não é que um bocejo distraído da dona do seu destino.
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Amor cão
Michael Carlebach, South Beach Pier, California, 1977
Não sei se o cão é o melhor amigo do homem e da mulher, só sei que das frases e reflexões (será isto merecedor desta classificação?) que mais me irritam são aquelas que têm por base a ideia de que o conhecimento aprofundado que se vai tendo dos homens conduz determinada pessoa a um crescente amor aos canídeos, em detrimento dos seus semelhantes. Eu, que tive um cão durante boa parte da infância, toda a adolescência e a maior fatia da juventude, que o sentia e tratava como parte da família, nunca esqueci, mesmo nessas tenras e néscias fases de desenvolvimento, que o meu terno e diabólico Snoopy não era comparável aos meus pares da condição humana. O Snoopy era irresistível, mas era um cão. Não desrespeito ou considero menos quem coloca o amigo de quatro patas no altar dos seus afectos, tenho apenas pena que boa parte dessas pessoas não entenda que essa devoção é uma forma de desistência, de reconhecimento da sua incapacidade de se dar aos outros, de os entender em todas as suas contradições tão humanas, de não conseguir deixar de por a ênfase nos defeitos de outrem sem olhar, preferencial e dedicadamente, a tudo o que faz com que os cães nos idolatrem.