Bolas e Letras
Era para ser sobre futebol e livros. Mas há tanto mundo mais, a mente humana dispersa-se perdidamente, o país tem tanto sobre que perorar, eu perco-me de amores bem para lá da bola e das letras: Evas, vinho, amor, amigos, cinema, viagens, eu sei lá!
A inevitável e irrenunciável cenoura
Violando novamente o espírito da silly season, debruço-me sobre a politiquice preferida da silly season, um assunto tão importante e estruturante do futuro da nação que só neste país poderia ser discutido em plena silly season. Silly silly silly. Falo da pretensa intenção da Dr.ª Isabel Alçada em acabar com os chumbos. Não vou filosofar sobre a temática, muito menos debater as várias correntes sócio-educativas que variam entre a fria e eficaz leveza nórdica aos ditames da reguada do antigamente. Vou fazer algo que parece cada vez mais ser desprezado nos dias de hoje. Colocar-me na pele dos alunos e introduzir a minha experiência pessoal por debaixo dessa pele.
Ok, mergulho dado, voltei aos anos 80 e sou agora um aluno que passa pela preparatória e o secundário. Sou bom aluno, utilizo mais a atenção nas aulas do que o estudo para cumprir o meu principal objectivo ano após ano: passar o ano e, se possível, tirar boas notas. Imagino que me tiraram a cenoura, que o fantasma do chumbo deixa de me perseguir e de me atazanar nos pesadelos pré-testes/exames e caio no vazio. Aos 11 anos, aos 14 anos, quem me vai fazer crer que devo estudar para me preparar para uma futura profissão, para assegurar o sustento da vida independente que inevitavelmente irá surgir, quem me convence que o amor pela cultura, as letras e os números são mais decisivos e relevantes para este jovem estouvado do que o futebol pelos cimentos do bairro, do que o ZX Spectrum, do que o bate pé nas traseiras da escola? Eu que tive como professora da minha vida a co-autora dos livros “Uma Aventura” escritos pela Senhora Ministra (a fantástica professora Ana Maria Magalhães), acho que está tudo muito perto de se entregar à irracionalidade e ao profundo desconhecimento da realidade lusitana. E o país, ansioso pelos impulsos dos seus governantes, dá desgovernados passos em frente, sempre em direcção ao abismo, sempre a brincar com o perigoso exercício que é equilibrar-se na corda bamba. Até que a corda rebente ou que o pé falhe. Até que caiamos em nós.