Bolas e Letras
Era para ser sobre futebol e livros. Mas há tanto mundo mais, a mente humana dispersa-se perdidamente, o país tem tanto sobre que perorar, eu perco-me de amores bem para lá da bola e das letras: Evas, vinho, amor, amigos, cinema, viagens, eu sei lá!
O poço da morte engolido pelo comboio fantasma
Não haverá bom lisboeta pelos middle thirties que não morra de saudades da feira popular. Haverá certamente alguns maus alfacinhas, macambúzios e enfadados, que odiavam secretamente o algodão doce, o diabólico poço da morte e os carrinhos de choque geridos pela ciganada que se passou toda para a feira do relógio. Confesso que nunca me preocupei a fundo em saber a razão porque acabaram com a feira, mas arrisco 1% da minha fortuna que a ganância, as vistas curtas e os insaciáveis desejos de lucro fácil e avesso ao interesse público estarão no topo das justificações. Não me venham para aí dizer que 1% será uma ninharia, até porque não conhecem a minha inestimável fortuna, até porque se forem a ver a Sr.ª Merkel anda para aí armada em forreta quando a Alemanha também só dá um 1% do seu PIB para o orçamento europeu.
Agora, para reviver as emoções dos carrinhos de choque ou as alucinações dos carrosséis mal aparafusados a transpirar ferrugem, tenho que me deslocar às terrinhas do nosso Portugal. Aí não há miúdas giras a soltar gritinhos por entre meias de renda e minissaias atrevidas, há as velhinhas com os poucos netinhos que sobram ou os emigrantes que regressam em busca da moça que sobrou. O provincianismo da feira popular no centro da capital faz falta aos lisboetas. Até já o açúcar escasseia quanto mais o algodão doce que nos besuntava os beiços. Tempos de merda, estes, sem os beijos roubados no túnel do comboio fantasma.
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2 comentários
De Teresa a 16.12.2010 às 15:33
Todos os dias olho para o espaço deixado vazio de gritinhos e rugidos esquisitos, e maldigo o dia em que a novidade, os brilhos, cores e segurança dos FunCenters como do Colombo começaram a afastar as gentes de lá. Era completamente diferente ter o pai a dizer que íamos à Feira Popular ou hoje dizer que vamos ao Shopping. Tirar fotos dos putos nos póneis e carrosseis, e enquanto os homens bebiam verdinho que saía da teta da vaca as mães vasculhavam aqueles inenarráveis quiosques à procura de quinquilharia que nunguém precisava.
Mais tarde era um espaço simpático para a sardinhada com os colegas do escritório durante o Verão.
Perdeu Lisboa, sem dúvida, mas perdemos muito mais nós, os que gostavam da tradição de possuir e pertencer áquilo.