Bolas e Letras
Era para ser sobre futebol e livros. Mas há tanto mundo mais, a mente humana dispersa-se perdidamente, o país tem tanto sobre que perorar, eu perco-me de amores bem para lá da bola e das letras: Evas, vinho, amor, amigos, cinema, viagens, eu sei lá!
De que é feito um olhar?
Fotografia de Willy Ronis
De que se alimenta o vazio e os sonhos por viver que bailam neste olhar? Do passado desperdiçado e corrompido pelas exigências de uma vida que não a almejada? De um futuro que nunca existiu mas que nunca desistiu de corroer o desejo? Do tempo que foge e jamais voltará? De amores não vividos ou mal vividos? Da relva que não se pisou, da chuva de que se fugiu, do calor excessivo enfrentado com demasiada roupa? Os olhos, o espelho da alma, são berlindes mortos quando por trás deles não há vida, quando escondem vidas secas, quando a estrada percorrida foi um traço contínuo, uma estrada sem curvas ou buracos no asfalto. No olhar, pode também dançar a valsa do arrependimento, mas o brilho dos olhos será bem mais baço se o lamento residir na ausência de ação em detrimento dos excessos da vida. Aliás, poucos são os que se mortificam por terem bebido a vida com goladas de sofreguidão, pois a opacidade do olhar está geralmente associada ao excesso de contemplação. De tanto olhar a janela da vida embaciou, faltou respirar sobre ela para dissipar o nevoeiro e descobrir a nitidez e o brilho esfusiante do astro rei - a vida como ela deve ser.